Bom samaritanoA Parábola do Bom Samaritano é uma famosa parábola do Novo Testamento que aparece unicamente em Lucas 10:30-37. O ponto de vista majoritário indica que esta parábola foi contada por Jesus a fim de ilustrar que a compaixão deveria ser aplicada a todas as pessoas, e que o cumprimento do espírito e da Lei é tão importante quanto o cumprimento da letra da Lei. Jesus coloca a definição depróximo num contexto mais amplo, além daquilo que as pessoas geralmente consideravam como tal. |
25.
Levantando-se um doutor da lei, experimentou-o, dizendo: Mestre, que
farei para herdar a vida eterna? 26. Respondeu-lhe Jesus: Que é
o que está escrito na Lei? como lês tu? 27. Respondeu ele:
Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração,
de toda a tua alma, de toda a tua força e de todo o teu
entendimento, e ao teu próximo como a ti mesmo. 28. Replicou-lhe
Jesus: Respondeste bem; faze isso, e viverás. 29. Ele,
porém, querendo justificar-se, perguntou a Jesus: E quem
é o meu próximo? 30. Prosseguindo Jesus, disse: Um homem
descia de Jerusalém a Jericó, e caiu nas mãos de
salteadores que, depois de o despirem e espancarem, se retiraram,
deixando-o meio morto. 31. Por uma coincidência descia por aquele
caminho um sacerdote; quando o viu, passou de largo. 32. Do mesmo modo
também um levita, chegando ao lugar e vendo-o, passou de largo.
33. Um samaritano, porém, que ia de viagem, aproximou-se do
homem e, vendo-o, teve compaixão dele. 34. Chegando-se, atou-lhe
as feridas, deitando nelas azeite e vinho e, pondo-o sobre o seu
animal, levou-o para uma hospedaria e tratou-o. 35. No dia seguinte
tirou dois denários, deu-os ao hospedeiro e disse: Trata-o e
quanto gastares de mais, na volta eu te pagarei. 36. Qual destes
três te parece ter sido o próximo daquele que caiu nas
mãos dos salteadores? 37. Respondeu o doutor da lei: Aquele que
usou de misericórdia para com ele. Disse-lhe Jesus: Vai-te, e
faze tu o mesmo.
"
– S:Tradução Brasileira da Bíblia/Lucas/X
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Elementos da parábolaJerusalémPara as religiões abraâmicas significa "a visão da paz", era um local de paz, história, religião e privilégio. Essa era a cidade que Deus escolhera para ali colocar o seu nome, o centro de adoração e comunhão com ele próprio. |
Jericó
Biblicamente era a cidade da maldição (Josué 6:26);
no entanto, era uma bela localidade, graças à sua
localização e suas palmeiras. Mas essa cidade, que
estivera debaixo da maldição durante séculos,
tornara-se, naquele tempo, um abrigo sacerdotal, onde viviam
sacerdotes quando não estudavam em Jerusalém,
distante aproximadamente 24 quilômetros.
A
estrada entre as duas cidades estava situada num vale rochoso e
perigoso, e era freqüentada por ladrões e assaltantes;
portanto não oferecia segurança aos viajantes. Sacerdotes
e levitas, graças à sua vocação religiosa,
nunca eram molestados pelos ladrões que, por causa de
seus atos de violência, fizeram com que aquela região
selvagem recebesse o nome de Adumim (Josué 15:7, Josué 18:7),
ou passagem de sangue. Josefo nos conta que um pouco antes de
Cristo haver narrado essa parábola, Herodes dispensara 40
mil trabalhadores do templo, e muitos deles se tornaram
assaltantes de estrada, corruptos, e tinham a seu favor os
lugares que ofereciam condições para se esconderem e
as curvas fechadas da estrada, para os ajudarem em seus saques
diabólicos.
Foi
por essa estrada infestada de ladrões que "um homem" viajava e
descia de Jerusalém para Jerico. Não sabemos quem ele
era. Provavelmente um mercador judeu. Talvez tivesse acontecido um
ato de violência como aquele, recentemente, e nosso Senhor,
ao tomar conhecimento disso, o usou com grande resultado.
É também provável que os ladrões
observaram os passos do viajante e conheciam quais eram os seus
negócios; e concluíram que ele provavelmente trazia
dinheiro consigo. Então armaram uma emboscada contra
ele e, após amarrá-lo, feriram-no e o deixaram quase
morto. Roubaram-lhe tudo o que tinha e vestia, de forma completa e
impiedosa. Mas esse foi apenas o menor dos danos que os ladrões
lhe causaram. Eles o espancaram violentamente e o deixaram exausto
e quase morto para que falecesse na solidão daquele
local inóspito. Aqueles assaltantes jamais esperavam que outro
viajante fosse passar exatamente naquele local da estrada,
deserta e perigosa, a tempo de salvar aquela vítima quase
assassinada.
É
nesse ponto que o Mestre das parábolas acrescenta um toque
fascinante: "Casualmente descia pelo mesmo caminho certo
sacerdote". Casualmente. Será que o viajante abandonado e
semimorto veria aquela situação como casualidade ou
destino? Será que Deus tinha alguma relação
com o desenrolar dos acontecimentos na vida dos homens, e sabia
como lhe providenciar alívio? A palavra usada aqui para
"casualmente" foi coincidência. Não foi por
frívola casualidade que o sacerdote, o levita e o samaritano
passaram por aquele mesmo local onde o homem estava deitado, gemendo.
Eles trilhavam aquele caminho porque Deus assim preparara aquele
momento, e assim cumpriu com exatidão o seu plano. O Senhor,
como planejador Onisciente, sabe como fazer acontecer um encontro
entre pessoas quando necessário. "Muitas boas
oportunidades estão encobertas sob os acontecimentos que
parecem acontecer apenas por acaso".
Na
providência de Deus ou nos registros dos evangelhos, não
existe casualidade. O sacerdote passou por aquele caminho exatamente
para que algo coincidisse e harmonizasse-se com outro
acontecimento. Ele jamais evitaria encontrar-se com o homem que
precisava de ajuda. No entanto o sacerdote não viu aquela
situação como uma feliz coincidência, algo
planejado por Deus para que pudesse ajudar uma alma necessitada.
Ele viu o viajante que fora abatido e estava agonizante, mas passou por
ele sem nada fazer.
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Doutor da Lei (vv. 25)
Um especialista na Torá.
No grego, nomikos, o qual seria considerado um "advogado" no contexto
não-judaico, aqui significa um especialista na lei judaica,
incluindo tanto a Torá Escrita quanto Oral (a
Tradição dos Anciãos mencionada em Marcos 7:2-4).
Sacerdote
Esse
saudável e despreocupado sacerdote, um servo da lei
obrigado a agir com misericórdia até para com um
animal (Êxodo 23:4-5).
Temos aqui um homem que dizia abertamente ser consagrado a Deus e,
nesse exato momento, estava a caminho de casa, após ter
cumprido o seu turno no serviço do templo. E claro
que, após as suas orações e
sacrifícios, ele será misericordioso para com o
homem que dolorosamente precisava de misericórdia.
Porém esse líder espiritual, que era um dos 12 mil
sacerdotes os quais viviam em Jerico naquela ocasião,
evidentemente tinha deixado Deus no templo e não tinha tempo nem
compaixão pelo seu desafortunado companheiro judeu. Talvez
ele estivesse demasiadamente apressado para chegar em casa, a fim
de cuidar de seus outros interesses. Assim como o doutor da lei, para
quem Jesus proferiu esta parábola, esse sacerdote conhecia a lei
com o seu mandamento sobre o amar a Deus e ao próximo; mas, se
havia um próximo, certamente era aquele homem abandonado,
seminu e agonizante que estava ali aos seus pés. Porém,
com dureza de coração, ele passa distante do ferido, pelo
outro lado!
O Levita
Sendo
chamado Levi, ele era quase certamente um descendente de Levi, filho
Ya'akov e, portanto, um membro da tribo levita separado para o trabalho
ligado ao Templo. O outro membro dessa tribo que veio a crer Yeshua foi
Bar- Nabba (Atos 4:36). O trecho de Êxodo 6:7 nos
diz que "Um grande múmero de Kohanim tornou-se obediente
à fé" (os kohanim ou sacerdotes são um clã
dentro da tribo de Levi).2
Entre
os judeus não-messiânicos de hoje, os kohanim ou levitas
ainda detém certos direitos e responsabilidades distintos
daqueles de outros judeus. Por exemplo, na leitura pública da
Torá numa sinagoga ortodoxa,
a primeira leitura é feita por um kohen, a segunda é
feita por um levita; e as leituras seguintes (da terceira até a
sétima) podem ser feitas por qualquer outro homem judeu.
Em
seguida, surge outro viajante e, com o seu caminhar, a esperança
volta a brilhar dentro do homem quase morto. O levita era da mesma
tribo do sacerdote, mas de um dos ramos inferiores. Era um servo do
templo e, como ministro de adoração e intérprete
da lei, deveria ter sentido grande vontade de ajudar aquela alma
assustada que ele viu; contudo, deixou o homem sem assistência.
Esses dois líderes espirituais deveriam ser os primeiros a
traduzir sua fé em Deus, em preocupação e cuidado
para com o corpo espancado do viajante.
Por
que Jesus introduziu o sacerdote e o levita na parábola? Foi
para reprovar uma religião falsa, sem coração,
destituída de compaixão, formal e organizada, para
revelar no bom samaritano o verdadeiro espírito da
religião em sua essência. Jesus era fiel à
religião dos judeus, mas escolheu o filho de Samaria, para
fortalecer a sua repreensão ao sacerdote e ao levita que
haviam falhado em sua sublime missão, da mesma forma que a
Igreja se esquece de seu dever primário, quando a fortuna, o
conforto, a descontração e o orgulho minam as
forças de sua compaixão.
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O Samaritano (vv. 33)
Um
homem de Shomron. Isto é, um homem de Samaria, mais conhecido
como o "bom samaritano". Tem havido inimizade por séculos entre
os judeus e os samaritanos (veja Yn 4:9N), e assim o interrogador de
Yeshua provavelmente também teria pouca apreciação
pelos samaritanos, e poderia ter pensado que se um sacerdote e um
levita se recusaram a ajudar o homem, quanto mais um indigno samaritano
o ajudaria. O próprio Yeshua tinha recentemente viajado
através de Samaria (9:51-53).
Os
samaritanos não eram puros em termos raciais, mas uma mistura de
judeu e gentio; por isso, eram odiados pelos que tinham o sangue
integral do grupo étnico judaico. Os judeus não queriam
comunhão com os samaritanos e os rejeitavam. Embora os dois
grupos morassem próximos uns dos outros, não se
consideravam e nem se tratavam como próximos no sentido moral da
palavra. Assim o doutor da lei deve ter ficado bastante surpreso,
quando Jesus apresentou o samaritano como a única
pessoa que se dispôs a ajudar aquele judeu indefeso, na
estrada solitária e perigosa. O homem que ajudou o
pobre necessitado foi exatamente o que ele menos esperava que o
faria.
A Bíblia de Jerusalém:
Azeite e vinho (vv 34)
Azeite e vinho eram considerados como remédios.
2 Denários (vv. 35)
Dinheiro equivalente a dois dias de trabalho, literalmente, "salário de dois dias".
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Propósito da parábola
Certo
dia um doutor da lei" testou o conhecimento e a autoridade de
Jesus com duas perguntas. A profissão de um "doutor da lei" era
ocupar-se com a lei mosaica. Ele tinha a função
oficial de interpretar a lei e guiar o povo em como relacionar as
suas vidas com ela. Quando um judeu tinha alguma dúvida que
o incomodasse quanto ao seu comportamento, ele consultava um doutor da
lei ou um escriba, para saber o que a Tora dizia sobre aquele
assunto. Ao opor-se a Jesus, esse doutor da lei disse: "Mestre, que
farei (eu) para herdar a vida eterna?" Ele queria que o nosso
Senhor o instruísse em como obter a vida em sua plenitude
—vida perfeita em todos os sentidos.
Jesus
replicou de maneira muito hábil. Aplicou um termo técnico
constantemente usado pelos escribas e doutores da lei que, ao
consultarem-se entre si sobre algum assunto da lei, diziam:
"Como lês tu?" Jesus disse: "O que está escrito na
lei? Como lês?" Isso direcionou a conversa novamente para o
escriba, e forçou-o a recorrer ao que ele já sabia
sobre os mandamentos da lei. E ele então concedeu a única
resposta correta e completa que poderia dar, i.e., que tinha de
amar a Deus e também ao seu próximo. Jesus o elogiou pela
sua resposta e disse: "Respondeste bem. Faze isso, e viverás". O
doutor da lei, por desejar sinceramente mais instruções,
perguntou: "E quem é o meu próximo?" Assim ele voltou
à segunda parte de sua própria resposta. Ele
não tinha dúvidas da existência de Deus e da
necessidade de amá-lo com o coração, alma,
forças e mente. O que o incomodava era a identidade do
próximo a quem ele devia amar. Como doutor da lei, ele pertencia
a uma categoria de mestres, os quais diziam que nenhum gentio
seria um próximo deles. Como judeu, ele só considerava
próximo aquele que pertencesse ao povo da aliança. Somos
informados que esse doutor da lei fez essa segunda pergunta sobre
o seu próximo, para justificar a si mesmo. Justificar-se
com quem? Não com o povo à sua volta, mas com a sua
própria consciência. Havia uma suspeita escondida no fundo
de sua mente, de que rejeitar um gentio, simplesmente por ser gentio,
não era correto e, então, como estrategista, ele procurou
jogar a responsabilidade sobre Jesus, que lhe respondeu com essa bela e
cativante narrativa, a qual chamamos de Bom samaritano.
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Interpretação
Cristo
dá o exemplo de um pobre judeus em apuros, socorrido por um bom
samaritano. Este coitado caiu nas mãos de ladrões que o
deixaram ferido e quase moribundo. Os que deveriam ser seus amigos o
ignoraram, e foi atendido por um estrangeiro, um samaritano, da
nação que os judeus mais desprezavam e detestavam, com os
que não queriam ter tratos. É lamentável observar
quanto domina o egoísmo nestes níveis; quantas escusas
dão os homens para pouparse problemas ou gastos em ajudar o
próximo. O verdadeiro cristão tem escrita em seu
coração a lei do amor. O Espírito de Cristo mora
nele; a imagem de Cristo se renova em sua alma. A parábola
é uma bela explicação da lei de amar ao
próximo como a um mesmo, sem acepção de
nação, partido nem outra distinção.
Também estabelece a bondade e o amor de Deus nosso Salvador para
com os miseráveis pecadores. Nós éramos como este
coitado viajante em apuros. Satanás, nosso inimigo, nos roubou e
nos feriu: tal é o mal que nos faz o pecado. o bendito Jesus se
compadeceu de nós. O crente considera que Jesus o amou e deu sua
vida por ele quando éramos inimigos e rebeldes; e tendo mostrado
misericórdia, o exorta a ir a fazer o mesmo. é o nosso
dever, em nosso trabalho e segundo a nossa capacidade, socorrer, ajudar
e aliviar a todos os que estejam em apertos e necessitados.
Esperava-se
que os rabinos debatessem questões teológicas em
público, e a pergunta que esse escriba (advogado) fez costumava
ser discutida com freqüência entre os judeus. Foi uma boa
pergunta feita por um péssimo motivo, pois o escriba queria
fazer Jesus cair numa armadilha. Mas o "feitiço virou contra o
feiticeiro", por assim dizer.
Jesus remeteu-o de volta à Lei, não porque a Lei nos salva (Gálatas 2:16, Gálatas 2:21, Gálatas 3:21)),
mas porque a Lei mostra que precisamos ser salvos. Não é
possível haver conversão verdadeira enquanto não
estivermos convencidos de que somos pecadores; a Lei é o
instrumento de Deus para convencer do pecado (Romanos 3:20).
O escriba deu a resposta certa, mas não a aplicou a si mesmo nem
reconheceu a própria falta de amor tanto para com Deus quanto
para com seu próximo. Assim, em vez de ser justificado,
colocando-se à mercê de Deus (Lucas 18:9-14),
tentou justificar-se e escapar de sua situação
difícil. Usou a velha tática de debate: "Defina esses
termos. O que você quer dizer com 'o próximo'? Quem
é meu próximo?"
Jesus
não disse que essa história é uma parábola,
de modo que é possível tratar-se do relato de um
acontecimento real. Jesus corria grande risco ao contar uma
história em que os judeus eram apresentados de modo negativo e
os samaritanos de modo positivo, e seu relato poderia ser usado contra
ele. Um exemplo desse tipo não seria verossímil o
suficiente para servir de parábola, de modo que seus ouvintes,
inclusive o escriba, entenderam que o fato realmente havia ocorrido. De
qualquer modo, trata- se de uma narração realista. A pior
coisa que se pode fazer com qualquer parábola, especialmente
esta, é transformá-la numa alegoria em que tudo
representa alguma outra coisa. A vítima torna-se o pecador
perdido, quase morto (fisicamente vivo, mas espiritualmente morto),
abandonado à beira da estrada da vida. O sacerdote e o levita
representam a lei e os sacrifícios, ambos incapazes de salvar o
pecador.
O
samaritano é Jesus Cristo, que salva o homem, paga suas contas e
promete voltar. A hospedaria é a Igreja, que cuida dos
cristãos, e os dois denários são as duas
ordenanças, o batismo e a Ceia do Senhor. Ao abordar as
Escrituras dessa maneira, podemos fazer a Bíblia dizer
praticamente qualquer coisa que nos convenha e, certamente, não
encontraremos a mensagem verdadeira que Deus deseja nos transmitir.
A
estrada de Jerusalém para Jericó era, de fato, perigosa.
Uma vez que os funcionários do templo a usavam com tanta
freqüência, seria de se imaginar que os judeus ou os romanos
tomassem providências para torná-la mais segura. No
entanto, é muito mais fácil manter um sistema religioso
do que fazer melhorias na vizinhança. Não é
difícil pensar em justificativas para a atitude do sacerdote e
do levita. (Talvez nós mesmos já tenhamos usado algumas
delas!) O sacerdote havia servido a Deus no templo a semana inteira e
sentia-se ansioso por voltar para casa. Talvez houvesse bandidos por
lá e estivessem usando a vítima como "isca". Por que se
arriscar? De qualquer modo, não era culpa dele que o homem
tivesse sido atacado. Por ser uma estrada movimentada, alguém
acabaria ajudando o homem. O sacerdote deixou a responsabilidade para o
levita que, por sua vez, não fez coisa alguma! O mau exemplo de
um homem religioso tem grande poder.
Ao usar o samaritano como o herói, Jesus desconcertou os judeus, pois judeus e samaritanos eram inimigos (João 4:9, João 8:48).
Não foi um judeu que ajudou um samaritano; antes, um samaritano
ajudou um judeu que havia sido ignorado por seus compatriotas/ O
samaritano demonstrou amor por aqueles que o odiavam, arriscou a
própria vida, gastou seu dinheiro (o equivalente ao
salário de dois dias de um trabalhador) e, tanto quanto sabemos,
jamais foi publicamente reconhecido nem honrado. O gesto do samaritano
ajuda a entender o que significa "usar de misericórdia" (Lucas 10:37)
e ilustra o ministério de Jesus Cristo. O samaritano identificou
a necessidade do homem desconhecido e se compadeceu dele. Não
havia qualquer motivo lógico para que mudasse seus planos e
gastasse seu dinheiro só para ajudar um "inimigo" necessitado,
mas a misericórdia não precisa de motivos. Por ser
especialista na Lei, o escriba certamente sabia que Deus exigia que seu
povo tivesse misericórdia de estrangeiros e de inimigos (Êxodo 23:4-5, Levítico 19:33, Miqueias 6:8).
Observe
como Jesus "virou a mesa" de modo tão sábio em sua
conversa com oescriba. Na uma tentativa de fugir a suas
responsabilidades, o escriba havia perguntado "quem é meu
próximo?". Jesus, porém, perguntou: "qual desses
três foi o próximo da vítima?". A grande pergunta -
"a quem posso demonstrar misericórdia?" - não tem
relação aJguma com geografia, cidadania ou raça.
Onde quer que precisem de nós, podemos nos mostrar
disponíveis e, como Jesus Cristo, usar de misericórdia. O
escriba quis discutir sobre o "próximo" de modo geral, mas Jesus
forçou-o a considerar um homem específico em necessidade.
Como é fácil falar de ideais abstratos e deixar de
resolver problemas concretos! Podemos discutir coisas como "pobreza" e
"oportunidades de trabalho" e, ainda assim, jamais auxiliar
pessoalmente a alimentar uma família com fome nem ajudar
alguém a arrumar emprego.
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É
claro, o escriba queria manter a discussão em nível
complexo e filosófico, mas Jesus tornou-a simples e
prática. Mudou o tópico do dever para o do amor, o debate
para a ação. Com certeza, o Senhor não estava
condenando debates e discussões, mas só alertando contra
o uso de desculpas para não fazer nada. Eleger uma
comissão para resolver um assunto nem sempre resolve! Uma de
minhas histórias prediletas sobre D. L. Moody ilustra essa
ideia. Quando Moody participava de um congresso em Indianápolis,
nos Estados Unidos, pediu ao cantor Ira Sankey que se encontrasse com
ele às 6 da tarde em determinada esquina da cidade. Quando
Sankey chegou, Moody pediu-lhe para subir em um caixote e cantar, e
logo um grupo ajuntou-se a seu redor. Moody disse apenas algumas
palavras, convidando os interessados a segui-lo até um teatro
próximo. O auditório não demorou a lotar, e o
evangelista pregou o evangelho para aquela gente espiritualmente
faminta.
Quando
os participantes do congresso começaram a chegar, Moody
interrompeu a pregação e disse: "Precisamos encerrar
nossa mensagem, pois os irmãos participantes do congresso
vão ter um painel de discussão sobre 'Como
Alcançar o Povo"'. Touché!
É
possível ler essa passagem e pensar apenas no "alto preço
de se importar com o semelhante", mas esse preço é muito
mais alto se não nos importarmos. O sacerdote e o levita
perderam muito mais com sua negligência do que o samaritano com
sua preocupação. Perderam a oportunidade de aprimorar seu
caráter e de ser bons mordomos do que Deus lhes dera. Poderiam
ter sido uma boa influência num mundo mau, mas escolheram ser um
péssimo exemplo. Esse único gesto de misericórdia
do samaritano tem inspirado o ministério assistencial em todo o
mundo. Jamais se deve considerar tal ministério um
desperdício! Deus nunca permite que um ato de serviço
feito com amor e em nome de Cristo se perca.
Tudo
depende da maneira de encarar a situação. Para os
ladrões, o viajante judeu era uma vítima a ser explorada,
de modo que o atacaram. Para o sacerdote e o levita, era um
incômodo a ser evitado, de modo que o ignoraram. Mas para o
samaritano, era alguém necessitando de amor e de ajuda, de modo
que cuidou dele. Hoje, Jesus diz o mesmo que falou ao escriba:
"Vá e proceda continuamente de igual modo"
(tradução literal).
H.
T. Sell, em sua introdução sobre essa narrativa que
pertence a todos os tempos, referiu-se a ela como "fábula,
maravilhosa e verdadeira, em todas as épocas e climas. As
circunstâncias nas quais foi estabelecida, os tipos humanos
que apresentava, a situação a que aludia, tudo isso
é encontrado na história de todos os tipos de homens
e quaisquer que sejam as situações em que se encontrem.
Ao deixar completamente à parte a sua importância
moral, e considerá-la apenas narrativa, nunca se
tornará sem sabor, antiquada, e nunca envelhecerá. Tudo
isso, simplesmente, porque é composta dos elementos da
verdade eterna e, de forma clássica, resume toda a
administração da conduta humana".
Há
escritores que dizem que o que temos nesse trecho não é
exatamente uma parábola. A forma de
representação por meio de figuras não
é como nas parábolas que já analisamos, as
quais usam de simbolismo, mas simplesmente expõem um exemplo
concreto. O ponto de vista de Goebel, que Salmond menciona, é o
seguinte: "Temos aqui a primeira parábola representativa
que faz contraste com as simbólicas, porque ilustra o seu ponto,
e não usa de símbolos, como a maioria das outras
parábolas de Jesus, mas simplesmente utiliza exemplos".
Cristo não usou símbolos, tomados da natureza ou dos
costumes, mas a partir de acontecimentos reais. Cremos
também que a narrativa fora adotada por Jesus, para
manifestar uma verdade específica. Concordamos
com Lang, quando ele diz que é "uma das parábolas mais
grandiosas e representativas do nosso Senhor. É tão
simples que até uma criança pode captar o seu
significado; no entanto é, na verdade, um tratado de
ética prática mais profundo e mais poderoso em seus
efeitos do que qualquer outro no mundo [...] Estamos tão
familiarizados com essa parábola, que não enxergamos a
grandiosidade da sua combinação de simplicidade e
profundidade, e também a grandiosidade do apelo que tem
sobre nós". Descobriremos que não há uma analogia
espiritual para cada imagem na narrativa. O quadro todo é
simplesmente um exemplo para ilustrar o agir da
benevolência, em contraste com o egoísmo.
A
conversa de Jesus com o doutor da lei, diálogo esse que deu
origem à parábola, não deve ser confundida
com o contato que ele teve com outro doutor da lei (Mateus 19:16, Marcos 12:28-34, Lucas 18:18). Na ocasião, aparentemente paralela, em Marcos 12:28-34, o nosso Senhor juntou duas passagens famosas do AT quando deu a resposta à pergunta do escriba (Deuteronômio 6:4, Levítico 19:18),
e Straton diz que "Lucas começa a sua narrativa onde Marcos
terminou". Mas o doutor da lei, nessa parábola, fez mais
perguntas do que o seu companheiro escriba. "Por uma
questão de lógica", diz Arnot, "essa parábola pode
muito bem ser combinada com a do Credor incompassivo. Formam um par;
essa última nos ensina a perdoar o que nos ofende, e a que
analisamos agora nos ensina a ajudar o que foi ofendido"
A
narrativa no grego começa com o vocábulo idoú.
Quando esse termo é traduzido como "eis que"
(expressão omitida em alguns traduções), nas
Escrituras, devemos estar atentos; "ele mostra que devemos dar uma
atenção especial ao que vem em seguida, como contendo
verdades nem sempre aparentes na superfície; porém,
que requerem uma investigação cuidadosa, e
meditação com oração, verdades que devem
ser descobertas como se busca um tesouro escondido". Devemos
compreender que, quando Jesus mostrou a falta de
coração do sacerdote e do levita e, por outro lado,
o comportamento correto do samaritano, ele não disse que
todos os líderes religiosos eram cruéis e nem que
todos os samaritanos tinham coração terno. Não
há dúvida de que havia sacerdotes e levitas
bondosos; por outro lado, havia muitos samaritanos maldosos.
Alguns deles não permitiram que Jesus e os seus
discípulos passassem a noite em suas vilas, quando estavam
cansados e precisavam de alívio (Lucas 9:53).
E foi o levita Barnabé, chamado Filho da
Consolação, que vendeu tudo o qual tinha para ajudar os
irmãos mais pobres Atos 4:36.
A
parábola de Cristo foi endereçada a um judeu e elaborada
dessa forma, como nos lembra Arnot, "para desferir um só golpe
nos dois pilares, sobre os quais a vida vazia do judeu daqueles dias se
apoiava". Eles confiavam em si mesmos, consideravam-se justos e
desprezavam os outros. Jesus não fazia qualquer
distinção de pessoas; portanto, não deixaria
passar despercebida a bondade de um, nem apoiaria a crueldade
do outro. Portanto, ele elaborou essa parábola para
humilhar a confiança que o doutor da lei tinha em seu
próprio senso de justiça, por ter nascido judeu e, ao
mesmo tempo resgatar o samaritano da posição de mau,
que estava aos olhos do doutor da lei, e exaltá-lo por sua
compaixão. Da mesma forma que aquele samaritano ferido
de lepra, que fora o único dos dez curados (os outros nove
eram judeus), também esse da nossa parábola louvou ao
Senhor pela sua cura. Aqui a narrativa nos apresenta um samaritano mais
benevolente para com o necessitado do que as outras personagens, e
as expressões de sua compaixão, cheia de
atenção, foram mencionadas por Jesus. Ele nos
dá aqui uma bela imagem, em alto relevo, da bondade do
samaritano. "Ele veio até onde ele estava, teve
compaixão, atou-lhe as feridas ao derramar azeite e vinho sobre
elas, colocou-o sobre o seu próprio animal, levou-o
até a uma hospedaria, e cuidou dele. De manhã, ao
partir, tomou dois denários e os deu ao hospedeiro, e lhe disse:
'Cuida dele, e tudo o que de mais gastares com ele eu te pagarei quando
voltar'.
|
A
descrição de como Cristo interpretou parabolicamente
a fraternidade dos homens, demonstrada na caridade com
relação aos necessitados de ajuda, foi resumida;
mas, ao mesmo tempo, abrangente. O sacerdote e o levita passaram
pelo homem semimorto, mas o bom samaritano foi até ele e, ao ver
o seu corpo espancado, machucado, teve compaixão e
prestou-lhe socorro rápido e eficaz. O bom samaritano fora
sábio com relação à sua viagem
através de uma região hostil, e incluíra em sua
bagagem atadur as, azeite e vinho. O , azeite era bastante usado pelos
antigos como remédio, no uso externo, para aliviar a dor de
ferimentos abertos (Isaías 1:6).
O vinhotambém era utilizado como medicamento, para ser aplicado
externamente em ferimentos e machucados. Após limpar os
cortes e estancar o sangue, o alívio que o homem realmente
precisava, o bom samaritano continuou incansavelmente a
prestar-lhe ajuda. Ele o levantou semimorto e colocou-o sobre
o seu próprio animal. Não há referência
às mulas do sacerdote ou do levita, uma vez que não
havia razão de mencioná-las. O bom samaritano renunciou
ao seu próprio animal e foi a pé, a fim de conduzir o
ferido até uma hospedaria na estrada. Passou a noite ali,
com o viajante que resgatara; pagou para que fosse cuidado; e
prometeu voltar e reembolsar ao hospedeiro as demais despesas de comida
e abrigo para o homem debilitado.
Seria
de esperar que o trio da narrativa fossem o sacerdote, o levita e
o judeu, ou israelita; porém a substituição por um
samaritano foi um toque de mestre, e Jesus, após concluir a sua
parábola, fez uma pergunta direta ao doutor da lei que
interrogara: "E quem é o meu próximo?" Na verdade
Cristo devolveu a pergunta ao doutor da lei, ao forçá-lo
a decidir quem era o verdadeiro próximo do homem que
caíra nas mãos dos ladrões. O que mais ele poderia
dizer além de: "O que usou de misericórdia para com ele"?
Jesus então fez a correta aplicação: "Vai, faze da
mesma maneira" que, na verdade, significa: "Tu também da mesma
maneira mostra misericórdia, e também
tornar-te-ás, com esse procedimento, o próximo daquele a
quem mostraste misericórdia". A continuação da
parábola e o seu ensinamento em essência foram para
mostrar que o mandamento divino de amarmos o nosso próximo como
a nós mesmos é cumprido quando nos empenhamos
constantemente em ajudar o necessitado, sem perguntar primeiro
quem ele é, e qual é a posição dele em
relação a nós. O samaritano provou ser
verdadeiramente um próximo, porque esse sentimento
revela-se através da misericórdia.
O
princípio fundamental de conduta humana, de filosofia de
vida, que essa parábola contém para nós é a
mesma pergunta que o doutor da lei fez: "E quem é o meu
próximo?" Como podemos distinguir quem é o nosso
próximo? Cosmo Lang diz: "Tenha um espírito que vise
sempre o interesse do próximo, e então cada pessoa
será o seu próximo". Alguém que precisa de
nós, é o nosso próximo, não importa o
seu grupo étnico ou religioso. "O verdadeiro sentimento, de
ser o próximo, não é uma questão de
proximidade física, de local, mas de amor". A verdadeira
pergunta não é tanto: "Quem é o meu
próximo", mas "Eu sou um próximo, verdadeiramente?"
Achamos
que os nossos próximos são os que moram do nosso
lado. Mas, tanto nós como eles, podemos agir de maneira
extremamente inversa ao verdadeiro sentimento de sermos
próximos uns dos outros, e achamos mais fácil amar e
ajudar os que estão distantes, do que os que estão perto
de nós. E no entanto esses são os nossos próximos.
No AT, no decorrer da Páscoa havia a seguinte
determinação: "Mas se a família for pequena para
um cordeiro, então convidará ele o seu vizinho
mais próximo, conforme o número das pessoas" (Êxodo 12:4).
Habershon diz: "O nosso próximo é aquele com quem podemos
dividir o Cordeiro. Temos próximos de ambos os lados: os que
são salvos e os que não o são; aqueles a quem
podemos oferecer ajuda no tempo da aflição e aqueles com
quem podemos manter comunhão"
Mas
o ensinamento da parábola de nosso Senhor é que "estar
próximo fisicamente não faz de ninguém um
próximo no sentimento", como Butterick. "O sacerdote e o levita
estavam próximos quanto ao grupo étnico e ao seu
trabalho, e o samaritano, quanto ao seu grupo étnico e ao seu
trabalho, estava bem distante. As pessoas podem morar perto umas das
outras, separadas apenas por uma estreita parede e, apesar disso,
não serem próximas umas das outras. As pessoas podem
morar sem separação entre si e ainda não
serem próximas umas das outras. Somente os olhos e o
espírito do samaritano conseguem a atitude correta de
ser próximo". A medida que caminhamos nessa vida, e casualmente
nos deparamos com os que, desesperada e urgentemente, precisam de
ajuda (espiritual, física e material), esses são os
nossos próximos, e esses são os que o próprio Bom
Samaritano deseja que ajudemos.
Uma
palavra final se faz necessária com relação
às várias aplicações dessa
parábola. Na parte introdutória, que chamamos de Os erros
e acertos da interpretação de parábolas,
mencionamos como Agostinho lidou com essa parábola de
forma tão fantasiosa, maneira essa que foi, até
certo ponto, ampliada por Keach. Mas, ao deixar de lado as
alegóricas interpretações forçadas,
existe uma aplicaçãolegítima para a
parábola. Porventura não considerou Deus a
humanidade o seu próximo? Ao perceber um mundo de
pecadores desprovidos de sua verdadeira natureza,
destituídos de ideais divinos, feridos pelos pecados, e
incapazes de se levantar, o Verbo se fez carne, habitou entre
nós, e deu ao mundo um exemplo equivalente ao do misericordioso
samaritano no que se refere ao agir. Por meio de sua morte e
ressurreição, Cristo veste a nossa nudez, ata as nossas
feridas e as cura com o bálsamo extraído de seu
próprio coração partido. Ainda mais, ele nos
coloca num lugar seguro, supre as nossas necessidades e prometeu
voltar e levar-nos para si mesmo. Essa parábola é, dessa
forma, radiante da beleza do evangelho de Cristo que, em sua vida
e morte, cumpriu todas as características apresentadas por
ela.
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