Simão Mago Simão
Mago é um personagem bíblico com quem o apóstolo Pedro travou polémica
em Samaria (At. 8, 9-24). Além do livro bíblico dos Atos dos Apóstolos,
o personagem é referido em outras obras ligadas ao gnosticismo.
O personagem bíblico
O
texto bíblico narra o episódio em que Simão tenta comprar dos apóstolos
o poder de operar milagres. Tal ato, considerado pecaminoso pela
teologia cristã, foi denominado de simonia (ato de Simão), termo que
define especificamente o comércio ou tráfico de coisas sagradas e
espirituais, tais como sacramentos, dignidades, indulgências e
benefícios eclesiásticos, e que estaria no centro das críticas e
discussão que conduziriam à Reforma protestante no século XVI. Esse
texto é demasiado lacônico, haja visto que limita-se a enquadrá-lo num
episódio onde apenas coadjuva um embate com o apóstolo Pedro. De resto,
diz somente que era samaritano e praticante de magia:
"
E, descendo Filipe à cidade de Samaria, lhes pregava a Cristo. / E as
multidões unanimemente prestavam atenção ao que Filipe dizia, porque
ouviam e viam os sinais que ele fazia; / Pois que os espíritos
imundos saíam de muitos que os tinham, clamando em alta voz; e muitos
paralíticos e coxos eram curados. / E havia grande alegria naquela
cidade. / E estava ali um certo homem, chamado Simão, que
anteriormente exercera naquela cidade a arte mágica e tinha iludido a
gente de Samaria, dizendo que era uma grande personagem; / 10 Ao qual
todos atendiam, desde o mais pequeno até ao maior, dizendo: Este é a
grande virtude de Deus. / E atendiam-no a ele, porque já desde muito
tempo os havia iludido com artes mágicas. / Mas, como cressem em
Filipe, que lhes pregava acerca do Reino de Deus e do nome de Jesus
Cristo, se batizavam, tanto homens como mulheres.
E
creu até o próprio Simão; e, sendo batizado, ficou de contínuo com
Filipe; e, vendo os sinais e as grandes maravilhas que se faziam,
estava atônito. / Os apóstolos, pois, que estavam em Jerusalém,
ouvindo que Samaria recebera a palavra de Deus, enviaram para lá Pedro
e João. / Os quais, tendo descido, oraram por eles para que
recebessem o Espírito Santo. / (Porque sobre nenhum deles tinha ainda
descido; mas somente eram batizados em nome do Senhor Jesus.) /
Então, lhes impuseram as mãos, e receberam o Espírito Santo. / E
Simão, vendo que pela imposição das mãos dos apóstolos era dado o
Espírito Santo, lhes ofereceu dinheiro, / Dizendo: Dai-me também a
mim esse poder, para que aquele sobre quem eu puser as mãos receba o
Espírito Santo. / Mas disse-lhe Pedro: O teu dinheiro seja contigo
para perdição, pois cuidaste que o dom de Deus se alcança por dinheiro.
Tu
não tens parte nem sorte nesta palavra, porque o teu coração não é reto
diante de Deus. / Arrepende-te pois dessa tua iniquidade e ora a
Deus, para que porventura te seja perdoado o pensamento do teu coração;
/ Pois vejo que estás em fel de amargura e em laço de iniquidade. /
Respondendo, porém, Simão disse: Orai vós por mim ao Senhor, para que
nada do que dissestes venha sobre mim." (Atos dos Apóstolos, Cap. VIII)
O personagem gnóstico
No
decorrer dos séculos surgiram inúmeras biografias apócrifas sobre este
personagem, fundamentadas em especulações diversas, dentre as quais uma
o imputa de ter sido fundador do Gnosticismo cristão. Tal atribuição é
historicamente contestável, todavia pode ser aceita de um ponto de
vista simbólico. Para
os Gnósticos, o mago da Samaria era um "rival" do Cristo, o qual fundou
uma seita que se proclamava representante da Gnose. A companheira de
Simão, Helena, era uma ex-prostituta que, segundo o mago, era a
encarnação de Sophia e de Helena de Troia. Simão acreditava na
Reencarnação e que o elemento Fogo é a raiz de todas as coisas,
nomeadamente a origem da Alma. Em suas viagens na Judeia, o mago
explicava que o conhecimento é a única chave para a ascensão aos Céus.
Afirmava
que o Deus do Velho Testamento é um Demiurgo. Conta-se que para provar
a validade de sua doutrina fazia demonstrações públicas de levitação.
Há um texto apócrifo que diz que Pedro (São Pedro) travou um embate
contra o mago da Samaria que questionava suas habilidades "voadoras".
Assim, no alto de uma torre, o mago dá o seu derradeiro vôo. Mesmo
assim, Simão é considerado o primeiro profeta Gnóstico. Ainda
conforme especulações, Simão Mago seria talvez o gnóstico Simão,
discípulo de Dositeu - um sábio cripto-judeu que havia se tornado herói
messiânico dos samaritanos - e de quem, afirma-se, Simão teria roubado
a esposa, dita Helena, uma ex-prostituta oriunda de Éfeso. Outras
relatos hipotéticos também apontam Simão como tendo sido discípulo do
profeta João Batista, ou que ele e o apóstolo Pedro teriam sido a mesma
pessoa.
O
que se pode afirmar de concreto é que Simão tornou-se figura
controversa da literatura antiga e medieval e da propaganda cristã. Uma
síntese do que foi dito a seu respeito está contida no livro Apologia
(c. 150) de Justino Mártir. Através dele ficamos sabendo que Simão
dizia-se "manifestação do Deus Supremo" - o que é repetido por seu
sucessor Menandro (o gnóstico) - e que sua esposa Helena seria a
primeira concepção de sua mente, da qual anjos e poderes foram gerados.
Descobrimos também que o sistema filosófico de Simão parecia baseado
numa cosmogonia sírio-fenícia e compreendia uma elaborada angelologia e
astrologia. São Justino menciona ainda a existência de um altar
consagrado a Simão na Ilha do Tibre, que de fato foi reencontrado em
1574.